Ouvia buzinas por todos os lados. Distantes, virando a esquina, zona sul, leste, norte, morte do silêncio. Desceu molhar a garganta, procurava álcool, achou água da torneira, ainda não cortada, sem peneira e muito menos gelada.
Mas continuava a ouvir buzinas potentes, insolentes em plena madrugada de segunda, não na segunda já que por hora era terça. Não houvera jogo, eleições, na boate bacanal, homenagem, deve ser um funeral, assim pensou. O atormentava aquela mosca, zunindo e dançando feito uma moça, seduzindo o bom humor, roubando-lhe a paz, a concentração também como quem diz: você não cheira bem. Bem sabia, mas quem o cheira além do inseto? E os faróis ainda reverberando o seu teto? Que melodia terrível, ele tremulava com a garganta já há muito arranhada, não cabia letra nem nada. Curioso, sob o teto rebocado, azul cor de veneno mais algum escarro sobre seu travesseiro que nunca fora tão ameno. Repentinamente as buzinas cessaram, os sinos da catedral próxima anunciaram: eram duas da manhã. Ele pensava, o céu deve ser melhor que isso, agora um eco fortíssimo daqueles nítidos até a última parede refletir. Tantos prédios altos, baixos, médios até o seu quarto, ele já um tanto farto amaldiçoou tais sinos. No quarto que não era seu, esse fardo ele sofreu. Ter tuberculose já deve ser agonizante e os últimos minutos que ele viveu, morreu ouvindo o montante dos sons atordoantes do funeral que era o seu.