segunda-feira, 30 de setembro de 2013

inclinação aos cotidianos

Como voltar a escrever sobre todas aquelas impressões de três anos atrás que me faziam me  expor aqui. Eis a questão. Tenho bastante o que falar sobre a casa das nossas avós e toda a sua falta de privacidade. Ambientes que entramos sem reservas. O quarto dos nossos pais como nosso direito e o nosso sendo apenas nosso. Toda a visão egoísta que, há muito, não é uma qualidade do ser. É um defeito. E falar das reformas das casas, todos os estranhos perambulando entre seus livros. Cheio de respingos no chão. Como salvar um animal de rua engrandece a alma quão menos haja alarde aos outros.

Eu tinha muito mais o que falar sobre como alguns livros nos devolvem o gosto da leitura. Como relembrar que eu podia ler mais de 100 páginas em um dia e não me cansar. Eu tinha um monte de coisa para falar do livro que estou lendo agora. Best-seller. E que, quando o tempo passa, a gente deixa de bobagem de os tornarem marginais pois é o que todo mundo lê no momento. Como os autores fazem para começar a escrever, como o mercado editorial é uma merda e como fico feliz com alguma promoção numa livraria, apesar dessa livraria não me oferecer nenhum autor conterrâneo. Só lemos gente de fora, a não ser que se tenha paciência de procurar um ou outro autor, ou visitar aquele sebo terrivelmente desorganizado que edita uns pseudos por aqui.

Noutros tempos, nós tínhamos muito mais coisa para dialogar por aqui. Um inspirava o outro sem perceber. O diálogo, as diversas opiniões, a troca.

Nesses tempos eu volto aqui a escrever poemas sem qualidade nenhuma. Cheia de coisa a dizer camufladas em algumas linhas que nem chegam a se completar horizontalmente. Cheia de lacunas que não serão preenchidas por ninguém, senão eu (que acho tudo óbvio). Dando margem a menor interação. Aos olhares que se resumem à preguiça de interpretar. Sem vontade de mostrar o que cá está a ninguém, pois nesses tempos de hoje não há um que se identifique. Que barreira foi essa criada à poesia? Foi essa mesma barreira que fez começar a escrever poema. Foi essa barreira que me inspirou a continuar, pois assim, continuaríamos sem diálogo. Nesse muro eu venho me escondendo e ninguém ousa estar aqui, do meu lado. Nem atreve atravessá-lo. Se posso ver um lado positivo desse silêncio todo é o que ele se revelou a mim. Me fez gostar de fingir ser poeta.

Mas venho crendo cada dia mais que já nem eu estou aqui.

os meus sonhos quando se revelam

os meus sonhos quando se revelam
são todos ébrios e assim se fazem

se mostram, pois, nesse estado
cuja vontade deve aguçá-los

conscientemente desejo que eles
não se percam;
rompam essa divisão;
materializem-se

para que meus sonhos
também sejam sóbrios
gloriosos
nobres
sem desmerecê-los pela ebriedade
no dia seguinte

que eu os traga a lume
ou que eles sejam gume
da minha opção de ser

que os meus sonhos
não se dispersem
nem pela memória
do meu ser ébrio

e que deles eu erga
um memorial
por cada linha escrita
nesse espaço
antes de adormecer e me tornar,
novamente,
meu superego

os meus sonhos quando se relevam
se elevam

terça-feira, 17 de setembro de 2013

prece em haikai

eu rogo à dureza
dessas goiabas verdinhas
Deus, amadureça!

artista

tal como Mecenas
abordas o ombro
palco de bobos
viagens apenas

não acredito em auto
estima que cria
tal ato

sou pobre de voz
pobre com cós
de calças apertadas

sou silêncio pois o que sei
é que espremida
a vida é nada
e o que eu sei da vida?
nada

terça-feira, 10 de setembro de 2013

mesa


alguém controla a mesa
o tempo teso, a temperatura

quem toma a fala
pode
o pobre é a pala
que o poder se cobre

a vida parece triste
me encontram e dizem
"que desanimada"
toma, bebe essa mágoa

há dias martelo
expressões enrugadas
corredores de pedra
leituras de praga

o baixar dos olhos míopes
que talham a face
o poema e o elo
sou ser velho

man

vejo que o homem
responde à verdade com a fuga

vejo que este homem
não compreende o verbo
vejo que um homem
ganha pra si, o só, quando perde

vejo tal homem
através dos azulejos da garagem
do mofo das paredes
(devido à chuva)

vejo que um homem
repousa sem limites quando,
o seu único desejo é a verdade

então o homem dorme

e para efetivar sua fuga
vira de lado a face
e em todo contra-turno
dito o meu, dorme
e se perde enquanto vejo