terça-feira, 28 de maio de 2013

insensíveis

o limbo onde vivem
os insensíveis seres
têm a mim o sossego
dizendo: "ei, apele,
ao fim sôfrego
dos inadmissíveis
insensíveis!"

segunda-feira, 27 de maio de 2013

* Fiama Hasse Pais Brandão, em Cenas Vivas, p. 12, Lisboa, 2000.

Nada tão silencioso como o tempo
no interior do corpo. Porque ele passa
com um rumor nas pedras que nos cobrem,
e pelo sonoro desalinho de algumas árvores
que são os nossos cabelos imaginários.
Até na íris dos olhos o tempo
faz estalar faíscas de luz breve.

Só no interior sem nome do nosso corpo
ou esfera húmida de algum astro
ignoto, numa órbita apartada,
o tempo caladamente persegue
o sangue que se esvai sem som.
Entre o princípio e o fim vem corroer
as vísceras, que ocultamos como a Terra.

Trilam os lábios nossos, à semelhança
das musicais manhãs dos pássaros.
Mesmo os ouvidos cantam até à noite
ouvindo o amor de cada dia.
A pele escorre pelo corpo, com o seu correr
de água, e as lágrimas da angústia
são estridentes quando buscam o eco.

Mas não sentimos dentro do coração que somos
filhos dilectos do tempo e que, se hoje amamos,
foi depois de termos amado ontem.
O tempo é silencioso e enigmático
imerso no denso calor do ventre.
Guardado no silêncio mais espesso,
o tempo faz e desfaz vida.

domingo, 19 de maio de 2013

Considerações

N'um poema resulta a minha vida
pois, agora, testemunho tal expansão
do espaço natural em suspensão
em torno do meu corpo, que finda

Pensei jamais recobrar a consciência
até me pôr de joelhos sobre o solo
nesta terra que desabrocha resistência
e me atinge com calma e dolo

Eis-me velando pela tranquilidade
esta já tão próxima da realidade
tal como a chegada ao sempre engano
melódico e doce como o som do piano

Destarte, um quadro construo, difuso
cuja moldura formato arabesco
dos sorrisos que me estão inclusos
no movimento dos ventos frescos

sexta-feira, 17 de maio de 2013

Do you realize? Flaming Lips, Yoshimi Battles the Pink Robots.



Do you realize, that you have the most beautiful face
Do you realize, we're floating in space,
Do you realize, that happiness makes you cry
Do you realize, that everyone you know someday will die

And instead of saying all of your goodbyes, let them know
You realize that life goes fast
It's hard to make the good things last
You realize the sun doesn't go down
It's just an illusion caused by the world spinning round

segunda-feira, 13 de maio de 2013

Hic et nunc

Tem brotado seca
a sabedoria ancestral.
Não cessa o meu astral
de oscilar ao fado
Ai, esta terra ainda vai...


engolir meus livros novos,
os vidros que golpeiam,
partidos pela herança
de não durar toda
uma linha na mão.


Eu já nem sei como durar
essa vida predisposta
Hic et nunc corre em uma veia
que nunca soube me fazer
antecipadamente.


Há uma força que me impede
Pede que eu cerre os punhos
e peça pela existência.
Insistência imatura.
Testemunho sobre o nada.
Ao nada eu escolho
uma cura atrofiada.

sexta-feira, 10 de maio de 2013

Rio Letes

Em adoração às águas de um rio
Cujo fluxo deságua no esquecimento
Apareço, desnudo, diante do sentimento
Romântico e anacrônico, por isso

Destino contempla a quarta margem
Donde encontrarei a azul myosotis
Azul tal como as águas do Letes
E dos pingos da noite sobre a garganta, ardis

Nesta margem, suas flores não hão de durar
Onde, após chegar, terei espasmos de sorriso
Pois que águas outras senão as do mar
Irresoluto descansarei em seu manto liso?


quinta-feira, 9 de maio de 2013

em ponto

o caminho de casa
tão longe parece
quanto o caminho
de uma mente rasa

é meia noite, em ponto
exploro o vazio
quando um dia é pouco
vida eu desaponto

acidentes que cometi
vidros quebrados
naveguei sob tiros
deportei o colibri

abrupta parada
completo desfecho
forço uma prece
pelo fim deste anseio

não finda