domingo, 29 de julho de 2012

Crônica de portão

Os ventos sacodem os portões. Ora quente, ora frio na esquina, todas as casas tem portão. São os tempos atuais, em sua maioria, que reclamam mais de um. A qualquer hora haverá, então, um fechado, outros abertos. Vários entreabertos. Quando pensas em sair, certamente espera a calmaria da rua. A ventura deriva dessa expectativa. Às duas, na madrugada, garanto uma ligação. Martelo sob o banco não é suficiente.

- Aguardo-te na esquina, duas ruas acima do canal.

Ao meu lacaio informo. Ei-lo, então, com a sua sirene, o barulho o qual me foge o terror. A falsa cura do tumor que cresce no homem, segurança, o medo. Os portões reverberam o vacilo do som, a mistura com os sonhos da ancestral tradição. Foi aqui, embora possam crer em um blefe, que pude presenciar a dança dos portões. Verdadeira ópera, deveras tensa. Ao me deparar com a cena, senti algo correr na veia. Adrenalina responsável pelo seu abrir e fechar. Deslizas como cisne sobre um espelho d'água. Prepara as brechas para as despedidas quentes. Sinto, pelos companheiros aspirantes a cosmopolitas. Sonhadores com vilas de muros baixos, ou nem isso. Encontrei um motivo pulsante de observar a rua. Atentar algo de vida no mais insípido paralelepípedo. A ansiedade do "abre-alas", no ocaso, na madrugada. O lado de fora do portão.

- Já estou dentro.

Notifico minha própria consciência. Num desenfreado encerrar de possibilidades. A espera, do outro lado, de algo surpreendente que não acontece. Me despeço da vida, do olhar virgem a essa rua. Olhar pra cima e ver o ninho de gato o qual dependo para escrever essa crônica. Essa esquina, essa novidade, que recompensa quem não sabe mais o que fazer.

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