Retrato falado, escrito, vivido. Adornado com a simplicidade e a minha sempre presente e querida descrição. Teu rosto bem sereno, como quem nunca se afeta. Uns olhos distantes, brilhantes e coloridos com a água do mar. Foi um retrato tirado no meio da calçada, num esbarrar, num lapso de embriaguez. Tinha uma música e, incrivelmente, lembrava a infância dela. Um dia já você já lhe dissera que lembrava a sua também.
Não faltaram espectadores, mas curiosamente só havia um fotógrafo. Dois, um par de olhos e eram os dela. Apreciaram aquela cena de forma completa e você não viu quando ela disparou o flash. Na verdade, tinha desligado porque as cores estavam numa perfeita harmonia.
Assim como nunca quis que soubesse da fotografia, e você não sabe, também desconhece a reciprocidade das inocentes e impulsivas palavras que ela ouviu aquele dia. No retrato vejo você, apenas. Uns refletores e buzinas. Um coração disparado e um riso contido. Incontido após tudo isso, riram juntos e você disse a ela que a sua cara de espanto estava hilária. Que não precisava de tudo aquilo e que exagerou na bebida.
Não pense que desconheço o sentido das coisas, ela sou eu. E você também. Só que com mais alguma coisa... e foi essa coisa que afrouxou o nó das pétalas e azedou o sabor da uva. O vinho que eu bebia não é o mesmo, o verde não tem mais o doce sabor. A garrafa compartilhada já não era suficiente para o libido.
Nessa fotografia eu vos encontro junto a uma áurea de sentimento inenarrável, como uma identidade. Olha, ela não está nem tão envelhecida como nós teríamos imaginado que estaria... Mas é nesse porta retrato que a poeira se acumula com maior intensidade.
terça-feira, 30 de novembro de 2010
segunda-feira, 29 de novembro de 2010
Semi-gravidade
Sois vento brando
Encosta-te amiúde
Azul celeste encoberto e furtacor
Deixa-me à deriva
Na esquina do oceano
Desancorada entre gigantes ondas
Torna-te balanço furioso
Quando lança-me sobre as nuvens
Ó, vento brando,
Poderás tu nunca largar da minha sombra?
E, pelos meus pés, puxar-me para baixo novamente?
Somente por algumas vezes... Somente quando o espaço parar de clamar por mim. Ou eu por ele.
Encosta-te amiúde
Azul celeste encoberto e furtacor
Deixa-me à deriva
Na esquina do oceano
Desancorada entre gigantes ondas
Torna-te balanço furioso
Quando lança-me sobre as nuvens
Ó, vento brando,
Poderás tu nunca largar da minha sombra?
E, pelos meus pés, puxar-me para baixo novamente?
Somente por algumas vezes... Somente quando o espaço parar de clamar por mim. Ou eu por ele.
sexta-feira, 12 de novembro de 2010
Cerne
O vermelho e suas várias tonalidades mescladas. Códigos e pesos indiscutivelmente difíceis.
Corda pendurada e a visão d'um jardim. Você só se enforca se não souber pulá-la.
Circular ou, sabe, uma forma anatomicamente conhecida. E distorcida. E infantilizada.
E que rima com negação, com sedução e com ambição. Se entrelaça com a razão, perdição e a estação. Ferve nas areias durante o verão quando encontra aquela ligação.
Que encaminha para a mesma corda,
A corda da cor da pulsante e inconstante
Que manifesta-se entre válvulas de escape
N'um canto de página, nos olhos, no susto
Ou onde você recolhe sua mão em respeito à pátria
A cor da sombra de um âmago incompreendido.
Uns tem, outros fingem não ter.
Corda pendurada e a visão d'um jardim. Você só se enforca se não souber pulá-la.
Circular ou, sabe, uma forma anatomicamente conhecida. E distorcida. E infantilizada.
E que rima com negação, com sedução e com ambição. Se entrelaça com a razão, perdição e a estação. Ferve nas areias durante o verão quando encontra aquela ligação.
Que encaminha para a mesma corda,
A corda da cor da pulsante e inconstante
Que manifesta-se entre válvulas de escape
N'um canto de página, nos olhos, no susto
Ou onde você recolhe sua mão em respeito à pátria
A cor da sombra de um âmago incompreendido.
Uns tem, outros fingem não ter.
quarta-feira, 3 de novembro de 2010
Reflexo intrínseco
(...) Com um olhar num misto de tristeza, aversão e curiosidade ele parava e observava ao redor. Costumava ficar envergonhado com o humor pervo e ácido das pessoas, mas isso foi ficando cada vez mais para trás. Em um passado onde já perdera a identidade e com suas células triplamente regeneradas, morava algo. Algo essencial, simples, puro. Não era de alguém, ou daquilo. Costumamos chamar de medo, e se era isso mesmo, ele o entendia como um sentido de existência. Sabia que vivia somente para superá-lo, ora mais... Como ter medo do medo? Ele é apenas algo abstrato... ora mais, não venha me dizer que você tem.
E assim, como um escorpião, provava do seu próprio veneno. Entretanto, não eram doses letais, um pouco a cada dia e ele degustava desse fel. Resistia fortemente a cada gota que se dissolvia no seu sangue.
Habituou-se ao veneno do, como dizem? Medo, como um entorpecente o qual o fazia perder o sentido. O tal medo é isso, droga lícita que de tanto usar vicia. E enlouquece. Ele acumulou medos, percebe? Doses e mais doses... Não entendo. Talvez ele esteja a me olhar agora, olhou de novo e está na espreita, estão vendo?
Foi esse o instante em que me olhei duas vezes no espelho...
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